Artigo: PROJETO NACIONAL E APROPRIAÇÃO LOCAL, A CRECHE PREINFANCIA
CONSERVA, C. S.
"Minha casa é meu chapéu."
Frase atribuída a Lampião no dia em que queimaram sua casa.
RESUMO
O objetivo desse artigo é refletir sobre como acontece a apropriação dos espaços quando caminhamos pelas obras de implantação do projeto padrão da Creche PREINFANCIA, fornecido pela Administração Pública Federal às prefeituras para ser construído em todo o território nacional, através de convênios de repasses de recursos. Para ser licitado, a lei exige que exista um projeto básico. Como equacionar um projeto a ser replicado em todo o país sendo o Brasil um país de dimensões continentais e enorme diversidade entre as regiões? Como o projeto básico é recebido nas diferentes cenários urbanos, ambientais, sociais e históricos?
Para isso buscou-se estabelecer a relação entre espaço projetado e espaço vivenciado, na hipótese de que o espaço visto como algo rígido, o espaço da prancheta, padronizado, renderizado, pode apresentar surpresas ao ser vivenciado. Pretendemos o objetivo de estudar a questão da arquitetura pensada e elaborada pela gestão Federal para ser construída, administrada e vivenciada pela gestão municipal, refletindo a presença de diferentes atores e interesses, que vão se contrapor à visão do espaço como se fosse algo rígido, enclausurado em padrões e padronizações.
Como acontece a recepção dessa arquitetura aparentemente sem identidade, mas que supostamente
representa o sonho coletivo ainda que dissociada das suas experiências vividas? O que acontece para que o espaço do habitar se construa a partir do projeto básico, sempre igual? Especificamente, buscaremos os objetivos de estudar:
• a recepção do projeto padrão, suas relações e interdependências, a espacialidade socialmente criada;
• atividades não previstas acontecendo, desconstruindo o discurso do desenho separado da dinâmica da vida, do tempo e do espaço;
• A adaptabilidade das atividades a uma configuração espacial fixa.
Tendo as cidades de Araporã e Prudente de Morais MG, Lagoa de Pedras RN, Formosa e Jatái GO,
Veranópolis RS e Tangará RN, como eventos para estudo, analisam-se imagens escolhidas que nos remetem a reflexões sobre o espaço como lugar onde se desenvolvem relações, formas e comportamentos que se combinam formando uma espacialidade muitas vezes diferente daquelas pensadas em projeto e sacralizadas pelas normas e leis, quebrando o senso comum, buscando a compreensão da relação espaço/sociedade.
Palavras chave: arquitetura, projeto, apropriação, replicar, habitar
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CONSERVA, C. S.
"Minha casa é meu chapéu."
Frase atribuída a Lampião no dia em que queimaram sua casa.
RESUMO
O objetivo desse artigo é refletir sobre como acontece a apropriação dos espaços quando caminhamos pelas obras de implantação do projeto padrão da Creche PREINFANCIA, fornecido pela Administração Pública Federal às prefeituras para ser construído em todo o território nacional, através de convênios de repasses de recursos. Para ser licitado, a lei exige que exista um projeto básico. Como equacionar um projeto a ser replicado em todo o país sendo o Brasil um país de dimensões continentais e enorme diversidade entre as regiões? Como o projeto básico é recebido nas diferentes cenários urbanos, ambientais, sociais e históricos?
Para isso buscou-se estabelecer a relação entre espaço projetado e espaço vivenciado, na hipótese de que o espaço visto como algo rígido, o espaço da prancheta, padronizado, renderizado, pode apresentar surpresas ao ser vivenciado. Pretendemos o objetivo de estudar a questão da arquitetura pensada e elaborada pela gestão Federal para ser construída, administrada e vivenciada pela gestão municipal, refletindo a presença de diferentes atores e interesses, que vão se contrapor à visão do espaço como se fosse algo rígido, enclausurado em padrões e padronizações.
Como acontece a recepção dessa arquitetura aparentemente sem identidade, mas que supostamente
representa o sonho coletivo ainda que dissociada das suas experiências vividas? O que acontece para que o espaço do habitar se construa a partir do projeto básico, sempre igual? Especificamente, buscaremos os objetivos de estudar:
• a recepção do projeto padrão, suas relações e interdependências, a espacialidade socialmente criada;
• atividades não previstas acontecendo, desconstruindo o discurso do desenho separado da dinâmica da vida, do tempo e do espaço;
• A adaptabilidade das atividades a uma configuração espacial fixa.
Tendo as cidades de Araporã e Prudente de Morais MG, Lagoa de Pedras RN, Formosa e Jatái GO,
Veranópolis RS e Tangará RN, como eventos para estudo, analisam-se imagens escolhidas que nos remetem a reflexões sobre o espaço como lugar onde se desenvolvem relações, formas e comportamentos que se combinam formando uma espacialidade muitas vezes diferente daquelas pensadas em projeto e sacralizadas pelas normas e leis, quebrando o senso comum, buscando a compreensão da relação espaço/sociedade.
Palavras chave: arquitetura, projeto, apropriação, replicar, habitar
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Resenha
crítica do texto:
Projeto Nacional e a Apropriação Local - A
Creche Preinfancia
Cátia dos Santos Conserva
Por: Vinícius Vieira
CRECHE PREINFANCIA - Utopia possível ou realidade imposta?
O
que as cidades de Formosa e Jataí no Goiás, Araporã e Prudente de Morais em
Minas Gerais, Lagoa de Pedras e Tangará no Rio Grande do Norte, e Veranópolis
no Rio Grande do Sul tem em comum? Se formos pensar em termos de localidade,
podemos dizer imediatamente que todas estão em território nacional, ou seja,
são cidades brasileiras. No entanto, em um país do tamanho do nosso, e partindo
do pressuposto que se localizam em regiões diferentes, podemos afirmar que,
fora o projeto CRECHE PREINFANCIA de iniciativa do MEC[1]
- implantado em cada uma delas, são complementamente diferentes uma das outras.
E
é justamente partindo dessas diferenças, das particularidades que cada
cidade/comunidade tem, que a autora pontua, de maneira elucidativa, problemas
que surgem somente depois que um projeto sai da prancheta do arquiteto para ser
implantado sem respeitar as singularidades locais. No PREINFANCIA, as creches
são concebidas de maneira padronizada pela iniciativa Federal (com blocos
divididos em setores, destinados a usos específicos com salas de amamentação,
de informática, refeitórios e etc.) e construídas pela iniciativa Municipal.
Cabe ao MEC a supervisão e às Prefeituras pagar a conta e “embalar a criança”
depois.
No
entanto, é justamente a partir desse ponto que os reais problemas surgem, tendo
em vista que a iniciativa que, apesar de ser louvável, implanta um projeto
padrão que, segundo a autora, deixa de lado etapas prévias essenciais ao
projeto arquitetônico, tais como: a pesquisa para definir as condições
topográficas, geológicas, clima, e o mais importante, as entrevistas com “os clientes/as comunidades” que serão
contempladas para saber suas reais necessidades e como será o uso futuro que
farão das instalações.
É
bem sabido que o espaço projeto não é um retrato do espaço vivenciado. E eis
aqui um dos grandes desafios da prática profissional do arquiteto, que encontra
eco em uma das várias citações apresentadas no texto: “é somente na travessia
da ponte que as margens surgem como margens” (Heidegger - Construir, Habitar, Pensar - 1954). Tal afirmação nos alerta que
projetar é uma coisa e viver/habitar é outra completamente diferente e que em
um projeto como o PREINFANCIA pode criar “surpresas” como a sala de informática
que vira brinquedoteca, a área de amamentação que ganha balanços, o refeitório
que perde sua utilidade frente a praticidade de se levar a merenda para o meio
do pátio ou a inutilidade de uma caixa d´água que sofre a falta da matéria
prima para preenchê-la.
Para
que projetos como o PREINFANCIA sejam realmente exitosos é preciso ter como
premissa que a arquitetura é mais um processo do que um simples ato de
projetar. Boas ideias são sempre bem-vindas, mas perdem sua utilidade quando a
realidade se impõe. Em tempos onde buscamos a excelência que se passa,
inclusive, pelo desenvolvimento sustentável, os arquitetos precisam talvez ser
menos utópicos para que seus trabalhos não se tornem uma realidade imposta,
pois é preciso respeitar as singularidades e ver que um projeto não termina
quando sai do papel. Afinal, citando mais uma vez Heidegger para finalizar, “Não
habitamos porque construímos, mas construímos porque habitamos”.