quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Minha Casa e a Cidade

Livro “Minha Casa... E a Cidade?”

A equipe do Observatório das Metrópoles integrante da Rede Cidade e Moradia participou do lançamento, durante o XVI ENANPUR, do livro “Minha Casa... E a Cidade? Avaliação do Programa Minha Casa Minha Vida em seis estados brasileiros”. A publicação faz um balanço dos cinco anos do maior programa de habitação do país, analisando as fases do programa, a qualidade construtiva e arquitetônica, e os impactos urbanísticos e sociais dos empreendimentos, e mais os efeitos sobre a vida das famílias e dos indivíduos atendidos.
Passados 5 anos do lançamento do Programa Minha Casa Minha Vida, os números oficiais apontam para mais de 3 milhões de unidades habitacionais contratadas. Distribuído por todas as unidades da federação, o programa adotou no seu início o déficit habitacional estadual como parâmetro para definir as metas a serem cumpridas, atendendo a percentuais pré-estabelecidos segundo as diferentes faixas de renda definidas para o mesmo. Tendo como alvo principal os municípios com população superior a 50 mil habitantes, o PMCMV permitiu a disseminação de empreendimentos habitacionais em centenas de municípios, sejam eles metropolitanos ou não trazendo no curto prazo impactos no processo de crescimento destas cidades.
O livro “Minha Casa... E a Cidade? Avaliação do Programa Minha Casa Minha Vida em seis estados brasileiros” foi lançado pela Rede Cidade e Moradia durante as atividades do XVI ENANPUR. Para a produção do estudo foram reunidos 11 núcleos de pesquisa, cada um dos quais com recortes espaciais específicos: (1) LABCAM FAU-UFPA (RM Belém e Sudeste do Pará); (2) LEHAB DAU-UFC (RM Fortaleza); (3) LaHabitat DARQ – UFRN (RM Natal); (4) Praxis Escola de Arquitetura –UFMG (RM Belo Horizonte); (5) IPPUR-UFRJ (RM Rio de Janeiro); (6) CiHaBe PROURB-UFRJ (RM Rio de Janeiro); (7) Polis-SP, (8) NEMOS – CEDEPE - PUC-SP (RM São Paulo / Osasco); (9) LabCidade FAUUSP (RM São Paulo e RM Campinas); (10) IAU-USP São Carlos + PEABIRU (RM São Paulo); (11) IAU-USP São Carlos (Regiões administrativas de São Carlos e Ribeirão Preto). Para sua realização, estes núcleos contaram com recursos obtidos junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Ministério das Cidades através de edital público lançado em 2012.
A seguir parte da “Apresentação” do livro escrita pelo pesquisador Caio Santo Amoré.

APRESENTAÇÃO
“Minha Casa Minha Vida” para iniciantes
Caio Santo Amore
Suponhamos um brasileiro que tenha vivenciado os anos de luta contra a ditadura militar, assistido à rápida e concentrada urbanização e à emergência dos movimentos sociais urbanos; acompanhado a política rodoviarista que incentivou o crescimento urbano horizontal e espraiado; a política habitacional autoritária do Banco Nacional da Habitação (BNH) – que beneficiou amplamente as classes médias e que construiu conjuntos habitacionais populares de baixa qualidade em áreas periféricas –; e a política habitacional “real” que relegou as populações de menor renda a favelas e loteamentos precários. Suponhamos que este brasileiro tenha entrado em estado de coma em 1986 – isolando-se de qualquer notícia sobre o Brasil e o mundo, portanto – e voltado à vida apenas em meados de 2014.
De cara, ele receberia uma avalanche de notícias: saberia do processo constituinte e da Constituição Cidadã; do primeiro presidente eleito diretamente depois de mais de duas décadas que se viu obrigado, no meio de seu mandato, a renunciar ao cargo depois de uma forte pressão popular; dos seus sucessores, todos com duplo mandato: o professor-sociólogo, o operário que liderava as greves nos anos 1980, a militante da luta armada nos anos da ditadura. Seria informado das mudanças da moeda, dos anos de recessão, dos níveis de desemprego a que chegamos, do descontrole/controle da inflação, da retomada do crescimento. Provavelmente se assustaria com os 83% da nossa população vivendo nas cidades, e lhe contariam como os problemas urbanos se agravaram – trânsito, violência, poluição, ocupação de áreas de proteção ambiental, precariedade e falta de moradia. Seria informado de que, na sua “ausência”, o BNH foi extinto, que a política urbana e habitacional se pulverizou pelos estados e municípios e que só depois de dezessete anos foi criado um ministério para lidar com as cidades.
Contariam a ele que um programa habitacional lançado em 2009 contratou em apenas cinco anos quase 80% das unidades que o BNH financiou nos seus 22 anos de existência, sendo que cerca da metade dessas unidades já foi entregue; que esse programa atende primordialmente a famílias de menor renda, pois tem níveis de subsídios que podem chegar a 96% dos valores financiados, que a produção habitacional ganhou escala industrial. Esse brasileiro saberia ainda que o programa permite que entidades populares sejam responsáveis diretas pelos contratos, que organizem as famílias beneficiárias, discutam os projetos e acompanhem a execução das obras e provavelmente ficaria impressionado com a obrigação de que a produção seja acompanhada de trabalho social, organizativo e comunitário, com recursos destinados exclusivamente para isso.
Possivelmente, depois do espanto, depois de imaginar que uma revolução urbana tenha se dado em nosso país ou que, finalmente, um pacto socioterritorial de inclusão dos trabalhadores finalmente se realizou entre nós, se nosso brasileiro tivesse a possibilidade de percorrer as nossas cidades e, particularmente, as periferias, ele talvez se perguntasse até que ponto todas essas novidades efetivamente se diferenciavam da realidade que ele presenciara na década de 1970. Buscando respostas para esse espanto e essas dúvidas, ele tomaria em suas mãos este livro. Ao longo de suas páginas, reconheceria os avanços alardeados, mas, olhando mais profundamente os contextos regionais e locais e os resultados de toda essa produção, poderia também se situar criticamente.
É com esse espírito que foram produzidos os capítulos que se seguem: olhar criticamente para a produção, analisando dados quantitativos e qualitativos, abordando escalas diversas, modalidades e fases do programa, a qualidade construtiva e arquitetônica, os impactos urbanísticos e sociais dos empreendimentos, os efeitos sobre a vida das famílias e dos indivíduos que têm se beneficiado das moradias.
Trata-se de uma produção coletiva de equipes autônomas, que analisaram diferentes aspectos do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) a partir de projetos de pesquisa aprovados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pelo Ministério das Cidades, em edital lançado em 2012. São equipes articuladas em uma rede, denominada Rede Cidade e Moradia, que partiram de uma perspectiva de análise comum – a questão da inserção urbana dos conjuntos habitacionais – que deu unidade às abordagens. As equipes, entre 2013 e 2014, reuniram-se sistematicamente, compartilharam metodologias, dados, hipóteses e achados de pesquisa. São onze equipes que falam sobre a produção em seis estados da federação, das regiões Norte, Nordeste e Sudeste (Pará, Ceará, Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo), vinculadas a seis universidades públicas, uma universidade privada e ainda a duas ONGs.
Organização dos capítulos
As pesquisas aqui reunidas abordam o Programa em diferentes contextos territoriais – regionais, intraurbanos – e dão diferentes enfoques na produção da casa (e da cidade)nessas localidades. Como já se mencionou, foram pesquisas autônomas, realizadas sem uma coordenação geral, apesar do frequente compartilhamento de dados, reflexões e achados. Como se poderá ver em detalhes nos dois capítulos que sucedem este e perfazem a Parte 1 da publicação, a metodologia comum permitiu às equipes uniformizar algumas linguagens, estratégias e escalas de análise da produção em cada localidade. Os eixos de análise foram definidos coletivamente, quase um ano depois de as pesquisas terem sido iniciadas, quando os primeiros dados já estavam coletados e algumas hipóteses levantadas – funcionaram como uma espécie de pauta para as reflexões. São quatro eixos que buscam aspectos mais específicos da produção e um quinto com caráter evidentemente transversal: (1) Arquitetura do Programa: agentes e operações; (2) Demanda habitacional e oferta do Programa; (3) Desenho, projeto e produção; (4) Inserção urbana e segregação socioespacial; e (5) Política habitacional e a produção das cidades.
Os artigos produzidos para este livro, espelhando a própria relação horizontal que se estabeleceu entre as equipes e o processo de troca que se deu durante as pesquisas, foram desenvolvidos livre- mente: alguns fizeram um esforço de consolidar uma síntese, outros privilegiaram aspectos mais específicos do seu campo empírico, outros ainda fizeram recortes temáticos ou espaciais. A organização dos capítulos que compõem a Parte 2 baseou-se nas “ênfases” que os organizadores detectaram em cada um deles a posteriori. O leitor notará, contudo, que há em todos eles transversalidades e uma multiplicidade de análises.
O capítulo de autoria da equipe do Observatório das Metrópoles do Instituto de Pesquisas em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR-UFRJ) explora o funcionamento do Programa tendo em vista os agentes que estão “na ponta”, operando diariamente com demandas, alianças, conflitos, interesses. Soma-se ao trabalho do Instituto Pólis e ao do Laboratório de Estudos de Habitação (LEHAB) do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará (DAU-UFC) como pesquisas que enfatizam a Arquitetura do Programa – sendo que o primeiro revelará as evidentes estratégias de negócios imobiliários que incorporaram áreas até então desprezadas pela produção residencial de veraneio na Baixada Santista, e o segundo analisa os arranjos institucionais no contexto da Região Metropolitana de Fortaleza, demonstrando o grande poderio dos financiadores e construtores diante da fragilidade dos poderes locais.
Os aspectos relativos ao Desenho, projeto e produção foram destacados em três capítulos. O grupo Cidade, Habitação e Educação (CiHabE) do Programa de Pós-graduação em Urbanismo da Univer- sidade Federal do Rio de Janeiro (PROURB-UFRJ) desenvolveu um “estudo projetivo” como metodologia de avaliação sobre a padronização das tipologias habitacionais e sobre a inserção urbana, reve- lando inadequações à diversidade de composições familiares e os problemas de mobilidade presentes na produção na “forma condo- mínio”. O Práxis da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (EA-UFMG), entre outras abordagens, avalia os pressupostos de projeto e seus resultados, os impactos urbano-ambientais e socioespaciais da produção em municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte. A equipe do grupo Habitação e Sustentabilidade (Habis) do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAU-USP), que pesquisou a produção em um contexto não metropolitano no estado de São Paulo, analisou a estrutura de provisão habitacional e de produção – projetos, canteiro, cadeia produtiva – e demonstra como a racionalidade industrial, articulada ao processo de financeirização, acabou por estruturar um campo intensivo e extensivo de promoção habitacional que agravou disparidades socioespaciais decorrentes da localização dos empreendimentos.
Os dois capítulos que seguem tocam mais especificamente a relação entre Demanda e oferta. O Núcleo de Estudos sobre Movimentos Sociais (Nemos) da Coordenadoria de Estudos e Projetos Especiais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Cedepe/PUC-SP) tratou de empreendimentos no município de Osasco e analisou o trabalho social, as motivações em relação aos processos participativos e os impactos na vida das famílias: mudanças nas relações sociais, nas condições reais de vida, vinculações a organizações sociais que indicaram as “demandas” que ocuparam as unidades. A equipe
formada da parceria entre o Laboratório de Estudos do Ambiente Urbano Contemporâneo LEAUC do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAU-USP) e a assessoria técnica Peabiru – trabalhos comunitários e ambientais abordou a modalidade Entidades, herdeira de uma produção habitacional autogestionária, e realizou incursões etnográficas para compreender a adesão das camadas populares ao Programa por meio de trajetórias de vida (moradia, trabalho e vida familiar/comunitária) de representantes de famílias selecionadas para compor a demanda de um empreendi- mento em São Paulo.
Inserção urbana e segregação socioespacial compuseram um eixo comum da Rede, desde os projetos de pesquisa aprovados junto ao Ministério das Cidades, de modo que estão presentes em todos os trabalhos aqui reunidos. Três dos artigos enfatizaram esse aspecto, de modos diversos. O Laboratório de Habitação (LabHabitat) do Departamento de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (DARQ-UFRN) discute como o Programa continua e acirra tendências preexistentes de ocupação do solo urbano (extensiva e intensivamente), em especial nas áreas contíguas ao polo da Região Metropolitana de Natal e como, em curto tempo – ou melhor, na escala e na velocidade da produção industrial –, reproduz os efeitos históricos da segregação e da desigualdade socioespacial.
O Laboratório Cidades na Amazônia (LabCam) da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Pará (FAU-UFPA) tratou de empreendimentos na Região Metropolitana de Belém e nos municípios de Marabá e Parauapebas, no Sudeste do Pará, e seu artigo aborda a produção de vetores de valorização imobiliária sobretudo pela incorporação de antigas áreas rurais ou periurbanas aos perímetros urbanos, para que fossem implantados os empreendimentos do PMCMV. O LabCidade (FAU-USP) buscou no capítulo de sua autoria avaliar em que medida os empreendimentos estudados nas Regiões Metropolitanas de São Paulo e de Campinas estavam satisfazendo os elementos básicos do direito à moradia, consignados em normas e tratados internacionais, demonstrando que, apesar de avanços em relação às melhorias nas condições de habitabilidade, a adequação cultural, a localização – e o correspondente acesso a equipamentos e serviços – e mesmo o custo acessível – paradoxalmente tendo os altíssimos níveis de subsídios do programa – são dimensões do direito à moradia que ainda não são plenamente atendidas.
Para fechar esta publicação, optou-se por apresentar a Nota Pública divulgada em blogs e redes sociais no mês de novembro de 2014. Lançado como um documento político, tão logo se conheceu o resultado das eleições presidenciais, a Nota intitulada “Programa Minha Casa Minha Vida precisa ser avaliado” foi construída coletivamente e reflete, mais que resultados, as preocupações dos pesqui- sadores. De alguma forma, dá conta da relação entre Política habitacional e produção de cidades, que foi tomada como a pauta transversal a todas as pesquisas.
O programa Minha Casa Minha Vida certamente abriu um campo de investigação urbana para os próximos trinta anos, do mesmo modo como o BNH continua a produzir. As reflexões – análises, opiniões, propostas alternativas, recomendações – desta rede, de outros pesquisadores, de setores da sociedade, da imprensa e do próprio governo estão sendo permanentemente produzidas, amadurecidas, contextualizadas, divulgadas, debatidas... Os trabalhos que este livro reúne são ingredientes adicionais para serem lançados no caldeirão do pensa- mento sobre o urbano no Brasil contemporâneo.
http://www.observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_k2&view=item&id=1203%3Alivro-%E2%80%9Cminha-casa-e-a-cidade%3F%E2%80%9D&Itemid=167

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Kevin Lynch

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Kevin Lynch é um dos grandes autores do Urbanismo, responsável por uma das obras mais famosas e mais influentes: A Imagem da Cidade. Nela, ele destaca a maneira como percebemos a cidade e as suas partes constituintes, baseado em um extenso estudo em três cidades norte-americanas, no qual pessoas eram questionadas sobre sua percepção da cidade, como estruturavam a imagem que tinham dela e como se localizavam.
Lynch identificou, como principal conclusão, que os elementos que as pessoas utilizam para estruturar sua imagem da cidade podem ser agrupados em cinco grande tipos: caminhos, limites, bairros, pontos nodais e marcos.
Concluiu também que essa percepção é feita aos poucos, já que é impossível apreender toda a cidade de uma só vez. Portanto, o tempo é um elemento essencial. Além disso, verificou que nada é experimentado individualmente, e sim em relação a seu entorno. Elementos semelhantes, porém localizados em contextos diferentes, adquirem significados também diferentes.
Cada cidadão tem determinadas associações com partes da cidade, e a imagem que ele faz delas está impregnada de memórias e significados. Portanto, nem tudo pode ser generalizado, apesar da aparente “universalidade” dos 5 elementos identificados por Lynch.

CONCEITOS PRINCIPAIS

Um dos conceitos básico trabalhados é o da legibilidade, entendido como a
Facilidade com que cada uma das partes [da cidade] pode ser reconhecida e organizada em um padrão coerente” (LYNCH, 1960, p.2).
É importante ter claro que a legibilidade a que Lynch se refere é aquela proveniente dos aspectos visuais da cidade, ou seja, não leva em consideração esquemas não-visuais tais como numeração de ruas ou outros sistemas que podem contribuir para a legibilidade mas não são ligados à imagem da cidade especificamente.
Estruturar e identificar o ambiente é uma habilidade vital para todos os animais que se movem e, por outro lado, a sensação de desorientação é angustiante para quem vivencia a cidade. Um ambiente legível oferece segurança e possibilita uma experiência urbana mais intensa, uma vez que a cidade explore seu potencial visual e expresse toda a sua complexidade.
Segundo Lynch, a percepção ambiental pode ser analisada segundo três componentes: estrutura, identidade e significado. A identificação de um objeto implica na sua distinção em relação a outras coisas, seu reconhecimento como uma entidade separada, ou seja, sua identidade. Além disso, a imagem da cidade deve incluir o padrão espacial ou a relação do objeto com o observador e com os outros objetos, oq ue Lynch chamou de estrutura.
Com relação ao significado, Lynch é mais cauteloso, não se aprofundando muito no conceito nem no seu estudo. A ênfase é, portanto, na identidade e na estrutura. Apesar disso, o autor argumenta que o objeto deve ter algum significado para o observador, seja prático ou emocional, e que isso está intimamente ligado à sua identidade e seu papel dentro de uma estrutura mais ampla.
Outro conceito importante de Lynch é a imageabilidade (imageablity, no original), entendida como a
Qualidade de um objeto físico que lhe dá uma alta probabilidade de evocar uma imagem forte em qualquer observador. Refere-se à forma, cor ou arranjo que facilitam a formação de imagens mentais do ambiente fortemente identificadas, poderosamente estruturadas e altamente úteis. (LYNCH, 1960, p. 9)
O conceito de imageabilidade, portanto, está ligado ao conceito de legibilidade, uma vez que imagens “fortes” aumentam a probabilidade de construir uma visão clara e estruturada da cidade.
Uma cidade com imageabilidade (aparente, legível, ou visível), nesse sentido, seria bem formada, distinta, memorável; convidaria os olhos e ouvidos a uma maior atenção e participação. (LYNCH, 1960, p. 10)

A IMAGEM DA CIDADE E SEUS ELEMENTOS

Caminhos (paths)
“São canais ao longo dos quais o observador costumeiramente, ocasionalmente, ou potencialmente se move. Podem ser ruas, calçadas, linhas de trânsito, canais, estradas-de-ferro” (LYNCH, 1960, p. 47).
clip_image002Os caminhos foram considerados como os principais elementos estruturadores da percepção ambiental para a maioria das pessoas entrevistadas. Pelo fato de as pessoas perceberem a cidade enquanto se deslocam pelos caminhos, estes não apenas estruturam a sua experiência mas também estruturam os outros elementos da imagem da cidade.
Alguns caminhos específicos podem adquirir especial relevância na medida em que:
  • Concentram um tipo especial de uso (ruas intensamente comerciais, por exemplo);
  • Apresentam qualidades espaciais diferenciadas (muito largo ou muito estreito, por exemplo);
  • Apresentam um tratamento intenso de vegetação;
  • Apresentam continuidade;
  • São visíveis de outras partes da cidade, ou possibilitam amplos visuais para outras partes da cidade;
  • Apresentam origem e destino bem claros.
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Figura 1 – Av. Beiramar Norte – Florianópolis – SC. Fonte: IPUF.
Quando os principais caminhos não apresentam identidade, a imagem global da cidade é prejudicada.
As esquinas são pontos importantes na estrutura da cidade, já que representam uma decisão, uma escolha. Nesses pontos a atenção do observador tende a ser redobrada, e por isso elementos posicionados junto a essas intersecções tendem a ser mais facilmente notados e utilizados como referenciais.
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Figura 2 – Rua de Barcelona. Autor: Giika.
Limites (edges)
clip_image008São elementos lineares constituídos pelas bordas de duas regiões distintas, configurando quebras lineares na continuidade. Os limites mais fortemente percebidos são aqueles não apenas proeminentes visualmente, mas também contínuos na sua forma e sem permeabilidade à circulação.
Podem ser considerados barreiras (rios, estradas, viadutos, etc.) ou como elementos de ligação (praças lineares, ruas de predestres, etc.). Podem ter qualidades direcionais, assim como os caminhos. Ao longo de um rio, por exemplo, sempre tem-se a noção de que direção se está percorrendo, uma vez que o lado do rio fornece essa orientação.
Outra característica dos limites é que eles podem ter um efeito de segregação nas cidades. Limites numerosos e que atuam mais como barreiras do que como elementos de ligação acabam separando execssivamente as partes da cidade, e prejudicando uma visão do todo.
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Figura 3 – Charles River em Boston. Foto: Wili Hybrid.
Bairros (districts)
Na concepção de Lynch, bairros são
partes razoavelmente grandes da cidade na qual o observador “entra”, e que são percebidas como possuindo alguma característica comum, identificadora. (LYNCH, 1960, p. 66).
clip_image012Nesse ponto, é importante esclarecer que a tradução para bairros, ou mesmo para distritos, pode gerar confusão. O conceito de Lynch refere-se a uma área percebida como relativamente homogênea em relação ao resto da cidade ou, ao menos, como possuindo uma certa característica em comum que permite diferenciá-la do resto do tecido urbano. É, portanto, um critério visual, perceptivo, ao contrário do critério administrativo que define o conceito tradicional de bairro no Brasil. As considerações a seguir referem-se ao conceito adotado por Lynch.
Os “Bairros” de Lynch não são limites administrativos.
As características que determinam os bairros podem ser das mais variadas naturezas: texturas, espaços, formas, detalhes, símbolos, tipos de edificação, usos, atividades, habitantes, grau de conservação, topografia, etc. Beacon Hill, em Boston, por exemplo (Fotos), foi reconhecida prlas ruas estreitas e inclinadas; casas antigas, de tijolos, em fita e de escala intimista; portas brancas; ruas e calçadas de paralelepípedo e tijolo; bom estado de conservação; e pedestres de classes sociais altas.
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Figura 4 – Boston – Beacon Hill. Fotos: David Paul OhmerStephan SegravesPaul Keheler.
Os bairros desempenham papel importante na legibilidade da cidade, não apenas em termos de orientação, mas também como partes importantes do viver na cidade, e podem apresentar diferentes tipos de limites. Alguns são precisos, bem definidos. Outros são mais suaves, indefinidos. Da mesma forma, alguns podem ser “introvertidos”; outros, “extrovertidos”.
Pontos nodais (nodes)
clip_image020São pontos estratégicos na cidade, onde o observador pode entrar, e que são importantes focos para onde se vai e de onde se vem. Variam em função da escala em que se está analisando a imagem da cidade: podem ser esquinas, praças, bairros, ou mesmo uma cidade inteira, caso a análise seja feita em nível regional.
Pontos de confluência do sistema de transporte são nós em potencial, tais como estações de metrô e terminais de ônibus.
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Figura 5 – Interseção de viadutos na China. Foto: Edward Burtynsky.
Outro tipo de nós que apareceram frequentemente nas entrevistas são as “concentrações temáticas”, tais como os centros puramente comerciais. Tais locais atuam como nós porque atraem muitas pessoas e são utilizadas como referenciais. A Pershing Square, em Los Angeles, também é um exemplo de nó, percebido como um local com características distintas, tais como a vegetação e as atividades que lá se realizam.
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Figura 6 – Los Angele – Pershing Square. Foto: Daquella Manera.
Lynch também concluiu que a forma espacial não é essencial para um nó, mas pode dotá-lo de maior relevância.
Marcos
clip_image026São elementos pontuais nos quais o observador não entra. Podem ser de diversas escalas, tais como torres, domos, edifícios, esculturas, etc.
Sua principal característica é a singularidade, algum aspecto que é único ou memorável no contexto. Isso pode ser alcançado de duas maneiras: sendo visto a partir de muitos lugares, ou estabelecendo um contraste local com os elementos mais próximos.
Parecem ser mais usados pelas pessoas mais acostumadas à cidade, especialmente aqueles marcos menos proeminentes, menores, mais comuns. À medida que as pessoas se tornam mais conhecedoras da cidade, estas passam a se basear em elementos diferenciados, ao invés de se guiar pelas semelhanças, utilizando-se de pequenos elementos referenciais.
A localização em esquinas maximiza sua importância.
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Figura 7 – Ópera de Sydney. Foto: Tim Sheerman-Chase; Catedral de S. Maria del Fiore – Florença. Fonte: Benevolo (1999)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BENÉVOLO, Leonardo. História da Cidade . São Paulo: Perspectiva, 1999.
LYNCH, Kevin. The image of the city. Cambridge: The M.I.T. Press, 1960.
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Kevin Lynch e a imagem da cidade4.7 out of 5 based on 24 ratings


sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Arquitetura tradicional para a melhoria das comunidades




preservação da arquitetura vernacular, além de materializar a importância de manter a identidade cultural dos povos, representa uma oportunidade para o desenvolvimento das comunidades economicamente vulneráveis. Isto é demostrado graças ao esforço conjunto de organizações não governamentais, entidades estatais e habitantes do distrito de Sibayo, em Arequipa (Peru), que propuseram junto a uma importante equipe de arquitetos, converter este pequeno povoado em um modelo para o turismo vivencial comunitário. 

Fonte: http://www.archdaily.com.br/br/780455/programa-de-moradias-rurais-e-desenvolvimento-social-em-sibayo-peru-arquitetura-tradicional-para-a-melhoria-das-comunidades?utm_source=ArchDaily+Brasil&utm_campaign=7b306fc3bf-Archdaily-Brasil-Newsletter&utm_medium=email&utm_term=0_318e05562a-7b306fc3bf-410593293